Grupos europeus representantes de vítimas de amianto e associações de campanha, manifestaram a sua preocupação com o próximo leilão (29 de janeiro de 2021) do antigo navio português Paquete Funchal, que está à venda, dois anos depois de ter sido comprado pela empresa britânica Signature Living, atual proprietária. As licitações para o navio de passageiros, que foi comprado em 2018 pelo grupo hoteleiro britânico por 3,9 milhões de euros, deverão começar nos 1.8 M€. Há rumores de que a embarcação – que permaneceu atracada em Lisboa desde que foi comprada – será desmantelada.
Segundo um ativista que tem acompanhado a situação nos últimos dois anos, existem “cerca de 100 toneladas de amianto em estado friável, nomeadamente os tipos de fibra crisotilo, amosite e tremolite” a bordo, que foram identificados por uma auditoria de substâncias perigosas. A exportação de resíduos perigosos, como o amianto, de Portugal para países em desenvolvimento é proibida pelo Regulamento de Envio de Resíduos da UE. O Paquete Funchal está ainda registado sob a bandeira de Portugal.
De acordo com o artigo 6.º do Regulamento de Reciclagem de Navios da UE (UE) n.º 1257/2013, os armadores devem assegurar que os navios com bandeira da UE destinados a serem desmantelados, sejam apenas reciclados em instalações que constam na Lista Europeia. No entanto, o novo comprador pode procurar contornar o regulamento, trocando a bandeira portuguesa por uma bandeira não-UE.
Comentando esta situação, Ingvild Jenssen, da NGO Shipbreaking Platform, disse que “O Covid-19 dizimou as indústrias europeias, incluindo as que oferecem atividades de lazer, como cruzeiros e entretenimento ao vivo. Dada a falta de procura destes serviços, é provável que o MV Funchal seja comprado para sucata. É altamente possível que um comerciante de sucata, conhecido por comprar em dinheiro, adquira o navio e que o leve para uma praia no Bangladesh, Índia ou Paquistão, contornando as regras de reciclagem de navios da EU e violando a legislação dos resíduos da UE. No sul da Ásia, os regulamentos ambientais são escassamente aplicados, e os trabalhadores, incluindo crianças, trabalham diariamente em condições terríveis. O facto de o leilão estar a decorrer em Londres não é garantia de que uma oferta de uma empresa anónima off-shore não será aceite.”
Carmen Lima, pertencente a um grupo que representa vítimas de amianto em Portugal – a SOS Amianto – está igualmente preocupada com o facto de os incentivos financeiros serem o fator decisivo para a alienação do Funchal:”A remoção do amianto e a descontaminação da embarcação devem ocorrer em Portugal, evitando a transferência de contaminantes para outro país, nomeadamente aquele em que os critérios para a remoção do amianto não são tão exigentes, e que podem colocar em risco a saúde dos trabalhadores de desmantelamento de navios e as suas comunidades. As vítimas de amianto em Portugal e no Reino Unido continuam determinadas em que a embarcação que teve um passado tão glorioso, não tenha um fim desonroso.”
29 de Janeiro de 2021